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terça-feira, 16 de novembro de 2010

Flagrante


Nesta encosta dentro de muros, neste trilho pisado e repisado por todos os visitantes do Castelo dos Mouros, está o lugar mais acessível para espiolhar sem vergonha os namoros da floresta de Sintra com o sol de Novembro. A chegada de gente rapidamente os espanta; por isso, quem procure deliciar-se com o flagrante deve chegar bem cedo e colocar-se em posição discreta.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Devassando a Privacidade de uma Faia


Em Abril, na encosta do Castelo dos Mouros, tínhamos observado o despertar um pouco tardio mas bastante rápido da nossa Fagus sylvatica preferida, que em poucos dias se aprontou para o Verão. Também tem o hábito de se atrasar um pouco a adormecer e, ao contrário do acordar, demora-se nos preparativos. Pelo menos, assim concluímos ao espiá-la e fotografá-la indecentemente. O nosso plano agora é vender estas imagens a uma dessas revistas de mexericos arbóreos de grande tiragem e enriquecer:

7 de Dezembro: Fagus sylvatica bocejando

26 de Dezembro: Fagus sylvatica deixando cair as pálpebras

4 de Janeiro: Fagus sylvatica respirando pesadamente

23 de Janeiro: Fagus sylvatica adormecida – e praticamente nua!

sexta-feira, 25 de dezembro de 2009

Monomania de Natal




Será que nem no próprio 25 de Dezembro podemos deixar em paz as zelkovas? Não, nem no próprio Natal. Ao meio-dia da véspera continuávamos a andar à volta delas. Como se pode ver, estão entre as árvores mais atrasadas dos parques. Mesmo após os temporais dos últimos dias, mantém uma cabeleira amarela abundante: decididamente, não querem largar o Outono e vai ser um problema convencê-las da chegada do Ano Novo. Estas zelkovas tornaram-se uma ideia fixa que deve estar a alterar as nossas feições, tornando os nossos gestos suspeitos e o nosso olhar um pouco chalado (uma palavra para as sacas da naftalina que as traças roeram): esgueirando-nos para os corredores estreitos rentes aos automóveis estacionados, que obstruem a respiração destes belos seres, as portas de um previsível BMW trancaram-se por precaução. Em qualquer caso suspiremos de novo, outra, outra e mais uma vez: que belas estão as zelkovas na entrada da Pena!

sábado, 19 de dezembro de 2009

Os Plátanos Secretos de Monserrate


Saindo dos caminhos aconselhados ao visitante, para fora do mapa do Parque de Monserrate, há um belo platanal (podemos chamar-lhe assim?) pouco conhecido. Há que seguir a ribeira que corre pela cascata e pelos lagos e atravessar a paisagem dos trópicos a que chamam “México”. Após uma mancha de bosque setentrional mais denso, o chão alarga-se sob um céu de altas abóbadas de plátanos.

Estas árvores atarefadas, que se despem apressadamente para o seu sono de beleza, não parecem estar habituadas a receber visitas e têm-se dado bem assim. Se nos portarmos bem, talvez nos permitam permanecer uns momentos em sossego sobre a folhagem caída, quietos, evitando perturbar a vida e morte rápida dos cogumelos, enquanto contamos com respeito os minutos decrescentes para o Inverno.



sábado, 12 de dezembro de 2009

Cogumelos atacam Monserrate


Exércitos de cogumelos, descidos dos céus, estão a apoderar-se de Monserrate. Avançam numa coluna ameaçadora, subindo a grande colina relvada para tomar o palácio e aí espetar a sua bandeira. Devem vir de vários planetas, porque não nos lembramos de ver tantos e tão diferentes cogumelos juntos há muito tempo – mas, também, há muito tempo que não vínhamos a Monserrate no Outono, nem nos aventurávamos pelos cantos mais virgens do parque. Aí, os caminhos menos percorridos estão cobertos de colónias de múltiplas nações e é quase impossível dar um passo sem pisar uma geração inteira de pequenas cabecinhas ameaçadoras.

A um de nós estes seres efémeros causam uma certa repugnância, não conseguindo sequer olhar para estes retratos sem algum nojo. Outro acha estas criaturas misteriosas e simpáticas. Apenas juntámos as vozes quando tropeçámos naquela massa castanha escura e realmente repelente, em diferentes estados de decomposição, que se mostra nas duas últimas fotografias. De algum modo, condizem com a magnólia morta em torno da qual cresceram; o seu fedor, que o leitor não pode, infelizmente, apreciar aqui, alargava-se por muitos metros e agoniava mesmo os mais estóicos.




quarta-feira, 9 de dezembro de 2009

Zelkovofilia



Pedimos desculpa por não conseguirmos largar as zelkovas, mas elas agora estão ainda mais estonteantes que há duas semanas e não permitem que as deixemos em paz. Quem conhece esta entrada principal da Pena sabe que o caos visual desse lugar deixa pouco espaço para apreciar zelkovas ou o que quer que seja. Estas fotos technicolor são especialmente mentirosas, pois foram enquadradas para iludir a realidade desagradável do meio da manhã de fim-de-semana. Esperamos, aliás, que dificilmente se perceba que se trata da entrada na Pena. Mas os passeantes que por lá passarem poderão improvisar umas palas em volta dos olhos e confirmar que estas belas árvores existem mesmo suspensas no ar e que a sua cor é mesmo esta. Que, vistas de nascente, as suas copas contrastam com os ramos nus dos castanheiros da Índia ao fundo e que, vistas de poente, desaparecem no amarelo dos plátanos-bastardos.

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

Sintra no Buçaco (III)


Correndo o risco de transformar este blog num Buçaco, acerca de, não resistimos a mais uma reportagem outonal de despedida com mais oito fotografias quadradas dessa mata cercada. Comecemos por nos lançar do parapeito da varanda da sala de jantar do Palace Hotel, o grande antecessor da Quinta da Regaleira, e voguemos para norte até ao solene Cupressus lusitanica a que chamam Cedro de São José e que, a caminho dos quatro séculos de vida, bate os mais velhos da Pena por duzentos anos:


Depois, planemos sobre uma encosta que parecerá familiar a quem conheça, por exemplo, a envolvente de Monserrate. Em tempos, toda Sintra deve ter sido muito parecida com esta assembleia etérea de Quercus vários, azevinhos, loureiros e medronheiros, que se reúne para conferenciar entre as portas das Lapas e de Coimbra:



Deslizemos depois ao longo de alguns caminhos amarelados até ao grupo majestoso dos grandes freixos – Fraxinus ornus – na base da Fonte Fria:




E encerremos, por fim, os mergulhos na floresta do Buçaco, aproximando-nos da orla nevoenta de mais uma abertura de luz demagógica, entre o arvoredo:

terça-feira, 1 de dezembro de 2009

Sintra no Buçaco (II)





Quem reparar nas etiquetas da mensagem anterior perceberá que as fotografias demagógicas que recolhemos, que podiam ser de Sintra, são antes do Buçaco. Numa visita recente voltámos a confirmar, como em Setembro, o mesmo sangue que parece correr em ambos os lugares. E mais abundantes ainda do que em Setembro, voltámos a encontrar, agora com toda a força persuasiva do Outono avançado, alguns dos encantos particulares que distinguem o Buçaco.

Como é costume, fontes de satisfação e fontes de tristeza caminham aos pares, como a flor e os espinhos na rosa. Assim, os males do abandono e da pobreza propiciam caminhos remotos e selvagens, floresta espessa vagamente interrompida por jardinagem deixada em descuido, placas caídas, cancelas ferrugentas e ermidas que se arruínam. O mais velho de todos os ciprestes-do-Buçaco no Buçaco – e em Portugal – é celebrado com um poema numa inscrição fanada:

Cedro de S. José
Plantado em 1644 (?)
é considerado o cedro

Nada aqui se aproxima daqueles caminhos diariamente aspirados e polidos sem ervas nem ramos fora do sítio, que se querem tornar moda na Pena e no Castelo dos Mouros e que tanto nos aborrecem. Mas também não estão à vista quaisquer gestos de recuperação da devota rede de passos e ermidas do Deserto e do Sacromonte, que deve ter tido o seu mais recente apogeu no primeiro par de décadas após a instalação das esculturas cerâmicas representando a Paixão, há 70 anos. Este conjunto decadente que lentamente se desfaz ilumina ainda a floresta fabulosa, aguardando socorro.

É também evidente que a mata nunca sofreu o abandono radical e prolongado a que Sintra esteve sujeita e, por isso, talvez não corra o risco de necessitar, nos tempos mais próximos, de um ataque tão radical e sangrento como o que em Sintra conhecemos. Nem a sua localização é propícia à invasão turística sintrense, com os seus milhões anuais da venda de entradas. Assim, as vistas que o Buçaco nos concede num passeio de Novembro recordam algo do que pode ter sido uma Sintra anterior ao furor dos dias de hoje e anterior às décadas abandonadas, quando livremente se entrava e saía da sua selva apenas discretamente cuidada.

quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Demagogia Fotográfica, ou «Mostra-me o Caminho»





Numa expedição fotográfica de há dois dias em que voltámos a recolher imagens muito parecidas com algumas que aqui colocámos em Setembro, um de nós desabafou que tudo isto não passava de demagogia sob forma fotográfica – objectos escandalosamente fáceis e vulgares, resultado de um só clique displicente que, no entanto, enganavam os seus espectadores com o seu sempre eficaz e pasmante efeito – como o efeito, disse um de nós, de provas fotográficas da existência de Deus.

É um facto: em certos lugares bem escolhidos, em momentos bem delimitados e fugazes, verificada a proporção exacta de luz e de vapor e sendo-nos oferecido o ângulo de visão eleito, um clique irrefutável basta para lançar de joelhos os incréus. Ou, em qualquer caso, para obter ilustrações que se adequem à Mostra-me o Caminho e a outras publicações místicas.

sábado, 21 de novembro de 2009

Zelkovas ruborescidas


Em Junho andámos embasbacados com a luz juvenil das zelkovas - as keyaki japonesas - na entrada da Pena. Agora, chegados ao auge da sua coloração rosa-verde rosa-encarnada, não nos devemos deixar abater pelos fios eléctricos que atravessam as copas, nem pela multidão de automóveis e autocarros da hora de ponta turística. Há sempre um ramo ruborescido que consegue escapar ao ruído para se mostrar aos seus admiradores.

terça-feira, 17 de novembro de 2009

Exemplar raro


No topo do Parque da Liberdade, do lado da Rua das Murtas, vive este raro e caprichoso exemplar de Palmeira-de-Tronco-Encarnado, que só se encontra nesta altura do ano. Quem pretender (muito justamente) prestar-lhe vassalagem deve correr: no Inverno a preciosidade converte-se em mera Palmeira-Palmeira.

domingo, 15 de novembro de 2009

Outono: last call




Quem quiser gozar por inteiro os prazeres do Outono sintrense vai ter de se apressar. Uns dias mais e a paisagem invernosa sobrepõe-se à outonal. Uma manhã molhada e escura como a de hoje já prenuncia o fim dos dias dourados. No entanto, ao longo da semana que vem, prevê-se tempo mais frio mas manhãs nevoentas seguidas por dias ensolarados, que ainda podem bem ser saboreados por inteiro, como despojos desta tão aguardada e demasiado curta estação do ano. Estas imagens, envelhecendo rapidamente, recolhemos há talvez sete dias na encosta do Castelo. Estamos a ver se não nos fogem entre os dedos.

sábado, 7 de novembro de 2009

Bruscamente, no Outono


Bruscamente as melias decidem amarelar. Tão rápida e intensamente que os observadores mais distantes ou distraídos podem pensar estar perante florações de Outono. Mas não, são apenas as folhas das asiáticas melias a outonar. As que aqui vemos encontram-se no terreiro defronte da estação da Portela de Sintra, há muito transformado em gigante parque de estacionamento e que podia e devia ser um outro tipo de parque: uma praça jardim com, por exemplo, estacionamento subterrâneo.


segunda-feira, 2 de novembro de 2009

Votos de Bom Inverno


Na Primavera que passou, numa manhã nevoenta de Maio, demos as boas vindas a um castanheiro adolescente que se instalou na orla do Castanhal da Rainha para, assim esperamos, o primeiro de muitos séculos de vida. Nesta manhã nevoenta de Novembro, levando-lhe votos de bom repouso de Inverno, saudámos de novo a sua beleza e a das folhas que lhe restam.

sábado, 31 de outubro de 2009

Poemas com “Outubro” (IIII)


Com flores despertadas num baldio pela chuva de Outubro e com o último dia de Outubro fecham-se os poemas com Outubro no nome:


*

VERÃO INDIANO


Outubro, flor do meu perigo –
primavera derramada pelos rios.

Ora me é indiferente até à morte
– o acero tem o voo quebrado, os fogos trazem tanto fumo –
ora o terror de existirem me afronta
radioso, como o astro vermelho.

Tudo é já sabido, a maré prevista
e porém tudo se obscurece e aclara
com fresca desesperação, com extraordinário
firmeza...

A luz entre duas chuvadas, sobre a ponta
do rio que me trespassa entre corpo
e alma, é uma luz da noite
– a noite que não verei –
clara nas selvas.


Cristina Campo
Trad. José Tolentino Mendonça

domingo, 25 de outubro de 2009

Poemas com “Outubro” (III)


Após a Rua das Murtas, subindo pela Rua Eduardo Van Zeller, está esta pedra e esta data gravada junto ao chão, três anos antes do ano de nascimento de Cristina Campo, e aqui está este terceiro poema contendo o nome “Outubro”:

*

CANÇÃOZINHA INTERROMPIDA


Debaixo do primeiro Outubro
a maré de folhas
à angélica noite
retinha o pé

Não vistas caíam
(lá tudo era furtivo),
lenta soletrava runas
ao plenilúnio uma figueira.

Desfiava do teu sonho
um gato suas cabalas,
varanda incomparável,
doce Fim do Mundo.

Só a veemente
minha hora lacerava
sobre o cancelo as rosas...
E derrubada uma estátua

talvez mordia – ao turbilhão
daquele voo – o Outono,
travesseiro de musgo
...


Cristina Campo
Trad. José Tolentino Mendonça

segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Poemas com “Outubro” (II)





A propósito deste amanhecer soalheiro de Outubro na encosta da Tapada do Castelo, o segundo dos quatro poemas de Cristina Campo com o nome “Outubro”:

*

Agora que voltada está a clepsidra
e o futuro, este sol ardente,
já me bate nas costas, com os pássaros
tornarei sem dor
a Bellosguardo: lá pousei a garganta
sobre verdes guilhotinas de cancelos
de um rosa eterno
vibravam as mãos, vazias de flores.

Oscilante entre o fogos dos olivais,
brilhava Outubro antigo, um amor novo.
Emudecida, afiava o coração
na navalha das águias impensáveis
(já próximas, já nossas, já distantes):
aéreos sepulcros, túmulos de neve
do meu amanhã pueril, do sol.


Cristina Campo
Trad. José Tolentino Mendonça




terça-feira, 13 de outubro de 2009

Poemas com “Outubro” (I)

Castanhal da Rainha

Agora que Outubro avança pelo Castanhal da Rainha, ocorre-nos que há um belo livro de poesia de Cristina Campo, cuja beleza italiana foi tornada belo português por José Tolentino de Mendonça (e publicada com uma bela capa e papel cheiroso pela Assírio & Alvim em 2002). Ora, nesse livro podem ser encontrados quatro poemas contendo o nome “Outubro”, que nos parecem perfeitos para nos acompanhar em quatro dias desta parte do ano. Eis o primeiro:


*

Dobra-se o vestuário branco estival
e tu desces o meridiano,
doce Outubro, e seus ninhos.

Estremece o canto derradeiro nos mirantes
onde o sol era a sombra e a sombra o sol,
entre fadigas acalmadas

E enquanto hesita tépida a rosa
o bago amargo destila já o sabor
dos sorridentes adeus.



Cristina Campo
Trad. José Tolentino Mendonça